13 de jul. de 2007
Considerações no Livro do Profeta Isaías
Parte 15
Em passagens como essas, a pureza e a sublimidade são tais que o leitor é levado a se maravilhar diante de tanto encanto, ao ponto de até imaginar estar ouvindo a própria voz do profeta. A alternância na intensidade das frases é igualmente percebida e, neste sentido, não se encontra em nenhum outro escritor bíblico uma variedade tão grande de recursos literários. A complexidade do estilo varia constantemente, razão pela qual o reconhecimento de tais mudanças se constitui no grande problema de interpretação de Isaías.
A quantidade de idéias no texto do profeta, igualmente, é algo que não pode ser questionado, e o seu autocontrole é, seguramente, tão notado nos capítulos controversos como naqueles que são aceitos pacificamente como da lavra de Isaías.
2. A semelhança na linguagem e nas construções gramaticais tem, também, sido provada por diversos estudiosos. Entretanto, não se pode negar que, da mesma forma, outros negam tal semelhança com veemência. Contudo, para se examinar esse ponto, seria necessário elaborar um verdadeiro tratado, o qual envolveria um número muito grande de textos hebraicos, bem como o emprego de uma tal sorte de argumentos que seriam somente apreciados por aqueles que têm profundo conhecimento desse idioma. Mesmo assim, certamente, a validade das conclusões de tal tratado seriam questionadas. Conseqüentemente, os mortais comuns devem se contentar com as alegações de autoridades no assunto, tais como Delitzch, Kay, Stanley Leathes, Dean Payne e S. Davidson, para citar apenas estes que concordam que há uma unidade geral na fraseologia dos escritos do profeta Isaías, ou que não há, de qualquer modo, suficiente evidências, no estilo e no vocabulário, que mostrem uma origem posterior dos tais capítulos controversos.
3. A semelhança entre as idéias, entre as imagens e entre as figuras de retórica é outro grande ponto sobre o qual é quase impossível, nos limites dessa introdução, tratar de maneira adequada. A idéia predominante do profeta a respeito de Deus está fundamentada na santidade do Criador — sua perfeita pureza, diante da qual nada que não seja absolutamente limpo pode permanecer. Em função disso, o título favorito empregado por Isaías para Deus é “O Santo de Israel”, o qual é utilizado onze vezes nos capítulos não questionados e treze vezes nos demais, enquanto que tal expressão só é usada cinco vezes em todo o restante do Antigo Testamento. Isso explica as suas palavras, na Parte I, quando o profeta vê Deus — Então, disse eu: ai de mim! Estou perdido! Porque sou homem de lábios impuros, habito no meio de um povo de impuros lábios, e os meus olhos viram o Rei, o Senhor dos Exércitos! (6:5). — e a sua descrição de Deus, na Parte III, como o Alto, o Sublime, que habita a eternidade, o qual tem o nome de Santo (57.15). Ao lado da santidade de Deus, o profeta gosta de exaltar o poder do Senhor. Assim, Deus é “O Poderoso de Israel” e tem esse poder magnificamente descrito em várias passagens. O Altíssimo e Santo Deus fez uma aliança com Israel, de tal maneira que eles são “o seu povo”, “os seus filhos” e “os seus bem-amados”, como nenhum outro povo o é. Todavia, esse povo rebelou-se contra Deus, quebrando a aliança e provocando com seus pecados a ira do Senhor, praticando a opressão e a injustiça, pela idolatria e pelo derramamento de sangue inocente. Conseqüentemente, eles foram rejeitados e condenados, bem como levados ao cativeiro e à Babilônia. Entretanto, eles não foram totalmente rejeitados, uma vez que Deus determinou punições ao seu povo, para corrigi-los e iria trazer de volta “os remanescentes”, colocá-los novamente em sua própria terra e lhes dar paz e prosperidade. E, assim, para maior glória ainda, Deus iria juntá-los aos gentios para formarem uma só igreja ou uma só nação. Ao seu tempo, dessa nação sairia, então, um grande Rei, o qual reinaria no “Santo Monte do Senhor”, sobre todo o seu povo para sempre. Tal Rei seria ainda um Redentor e um Salvador, reinando com justiça e paz, num lugar onde o choro não mais seria ouvido e onde não haveria mais ruínas e destruição.
Entre as imagens favoritas de Isaías, as quais estão em todo o livro, tanto nos capítulos aceitos pacificamente como nos demais, pode-se observar as seguintes:
• As imagens de “luz” e de “trevas”, usadas em sentido espiritual, para iluminar a ignorância moral. As pessoas de maneira geral estão tão familiarizadas com essas imagens, posto que elas são muito usadas no Novo Testamento, que terminam por considerá-las como imagens comuns à Bíblia, e não como uma característica particular de alguns autores sagrados. Todavia, o uso metafórico de “luz” e “trevas” é raro no Antigo Testamento, aparecendo apenas em três livros — Jó, Salmos e Isaías. Além disso, Isaías é o único profeta que usa tais imagens com freqüência. Para se ter uma idéia, ele utiliza a palavra “luz” em sentido metafórico, pelo menos, dezoito vezes, e “trevas”, dezesseis vezes. Contrastando tais palavra uma com a outra há nove ocorrências. Cabe observar, também, que as referidas palavras, em oposição uma à outra, ocorrem quatro vezes nos capítulos aceitos pacificamente e cinco vezes naqueles que são questionados.
• As imagens de “cegueira” e de “surdez” são usadas em condições semelhantes, o que é quase uma peculiaridade de Isaías em relação aos demais escritores do Antigo Testamento, ocorrendo cerca de doze vezes em todo o livro.
• A imagem do povo como “uma flor que secou” ou “uma folha que murchou” ocorre, também, várias vezes por toda a obra do profeta.
• A imagem de “tronco”, raiz, ou “renovo” aplicada ao Messias ocorre três vezes.
• As expressivas imagens de paz e de prosperidade no reino do Messias são, praticamente, idênticas tanto no “verdadeiro Isaías”, como “nos outros”. Compare-se a título de exemplo as seguintes passagens: — Ele julgará entre os povos e corrigirá muitas nações; estas converterão as suas espadas em relhas de arados e suas lanças, em podadeiras; uma nação não levantará a espada contra outra nação, nem aprenderão mais a guerra(2:4). — A justiça será o cinto dos seus lombos, e a fidelidade, o cinto dos seus rins. O lobo habitará com o cordeiro, e o leopardo se deitará junto ao cabrito; o bezerro, o leão novo e o animal cevado andarão juntos, e um pequenino os guiará. A vaca e a ursa pastarão juntas, e as suas crias juntas se deitarão; o leão comerá palha como o boi. A criança de peito brincará sobre a toca da áspide, e o já desmamado meterá a mão na cova do basilisco. Não se fará mal nem dano algum em todo o meu santo monte, porque a terra se encherá do conhecimento do Senhor, como as águas cobrem o mar (11:5-9). — E será que, antes que clamem, eu responderei; estando eles ainda falando, eu os ouvirei. O lobo e o cordeiro pastarão juntos, e o leão comerá palha como o boi; pó será a comida da serpente. Não se fará mal nem dano algum em todo o meu santo monte, diz o Senhor (65:24-25).
• A imagem de “água” com o significado de vida espiritual e refrigério da alma ocorre, igualmente, em todo livro, embora mais freqüentemente na Parte I.
• A comparação de Deus com um oleiro, ou com um homem que dá forma ao barro, é encontrada também na Parte I e na Parte III do livro.
• Jerusalém, à sua vez, é representada por uma tenda com toldo, estacas, cordas e tudo o mais.
• A purificação dos pecados de Israel é descrita como o crisol onde se retiram as escórias de um metal.
• Entre outros exemplos de metáforas comuns aos capítulos aceitos em relação aos questionados pode-se citar a “estopa” para significar algo que é fraco e facilmente consumido pelo fogo; o “restolho” e a “palha” com o mesmo significado; o “deserto transformado em pomar” num tempo de bem-estar espiritual; o “estar bêbado” ou “embriagado” com o significado de estar espiritualmente apaixonado; a “cura das feridas do seu povo”, significando o perdão de Deus por seus pecados; uma “torrente impetuosa” ou “as impetuosas águas”, por uma horda de invasores; um “redemoinho” ou “torvelinho”, significando as rodas dos carros; o “gemido da pomba”, por um lamento; os “vermes” para significar decadência e dissolução; uma nação “comendo a sua própria carne”, significando a desunião e a discórdia interna; a “sombra” conotando a proteção de Deus; um “banquete de coisas gordurosas” ou “finos manjares”, por bênção espiritual; o “florescer da terra” ou “o romper em cânticos da terra”, significando a alegria do ser humano; e a “prostituição”, denotando a falta de fé.
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